Editorial
DOI:
https://doi.org/10.5281/sppa%20revista.v17i3.289Abstract
Como todos nós sabemos, as entidades psicanalíticas promovem inúmeras atividades a cada ano. Nesses encontros são debatidos temas de grande interesse, tanto para aqueles que trabalham com a psicanálise e a estudam, quanto para aqueles que se interessam pelas vinculações de nossa disciplina com outras áreas do conhecimento.Ocorre que as ideias debatidas nesses encontros se propagam, em geral, principalmente entre os que presenciaram os debates. Além disso, os trabalhos apresentados são, em sua maioria, “engavetados” pelos autores. Com isso, se perde a possibilidade de ampliar o público que tem acesso aos temas discutidos. É nesse espaço que procura ampliar a divulgação das ideias debatidas nesses eventos que entram os periódicos científicos de nossas instituições.
Assim, para todos os membros do corpo editorial da Revista, é uma satisfação disponibilizar aos nossos leitores a publicação da grande maioria dos trabalhos apresentados no Simpósio de Psicanálise da Infância e da Adolescência, organizado pelo Núcleo de Infância e Adolescência da SPPA, ocorrido em maio de 2010 na sede de nossa Sociedade.
Como já havíamos realizado com o Simpósio de Pesquisa em Psicanálise da SPPA, ocorrido em abril de 2010 e publicado na edição anterior, considerávamos importante reproduzir, em nossas páginas, os trabalhos apresentados no encontro que debateu o tema Construções da Alteridade em Psicanálise de Crianças e Adolescentes.
Nas páginas dedicadas ao evento, os leitores poderão constatar que os colegas da SPPA, Cátia Melo, Ivan Fetter, Juarez Guedes Cruz, Miriam de Santis, Paulo Fonseca e Viviane Mondrzak, bem como os convidados Vera Regina Jardim Ribeiro Marcondes Fonseca, Fernanda Ribeiro e Francisco Marsahll abordam o tema proposto a partir de inúmeros vértices, contribuindo para a busca da compreensão dos fenômenos da atualidade que participam na construção da alteridade de nossos jovens.
Seguindo no tema da função de uma Revista, isto é, ampliar a divulgação de ideias, também é um motivo de satisfação para nós o recebimento de trabalhos de colegas de outros centros psicanalíticos, do Brasil e do exterior. Samuel Arbiser, psicanalista da Argentina, em seu artigo O legado de David Liberman, apresenta uma atualização das contribuições deste original pensador da psicanálise contemporânea. O Dr. Arbiser, após uma apresentação muito sintética dos dados biográficos de David Liberman e dos traços distintivos como mestre e indivíduo, tenta captar o sentido e a visão panorâmica de sua obra, ou quais as perguntas e problemas da psicanálise por ela colocados. Na opinião do autor, essa obra consistiria numa séria tentativa de sistematizar a clínica psicanalítica a partir da singularidade e da tolerância do que é diverso nos seres humanos, com a maior precisão e o maior rigor científico admitidos pela disciplina psicanalítica, evitando, por um lado, o clichê, e, por outro, a mistificação oracular.
Em A arquitetura da ponte entre self e outro, Vera Regina Jardim Ribeiro Marcondes Fonseca, psicanalista de São Paulo, aborda questões sobre o nascimento do self vinculado ao nascimento do outro, já que ambos estão intrinsecamente ligados. Segundo a autora, a partir da matriz diádica, o desenvolvimento do self ocorre simultâneo ao encontro com o outro, sendo tal processo caracterizado, em um dos polos, por momentos de sintonia, espelhamento e imitação, que privilegiam a experiência de igualdade entre mãe e filho, alternando com momentos de ruptura que revelam as diferenças recíprocas. Entre estes dois polos, há uma constante tentativa de recuperação do estado diádico de sintonia.
Do outro lado do Atlântico, mais precisamente de Milão, nos chega o artigo Pacientes difíceis e comunicação não verbal: mudanças em psicanálise, do psicanalista Antonio Imbasciati. Nesse texto, Imbasciatti parte de um fato bastante conhecido dos psicanalistas, isto é, pacientes aparentemente receptivos ao trabalho psicanalítico focalizado na interpretação, que não apresentam mudanças internas correspondentes, principalmente a longo prazo, e que, muitas vezes, prolongam indefinidamente a análise. Segundo o autor, tal fato chama a atenção para os fatores terapêuticos não verbais, que acompanham o trabalho de interpretação. Para abordar esse tema, o autor destaca o atual desenvolvimento da psicanálise infantil, com crianças pequenas e com recém-nascidos e seus pais e o compara com o desenvolvimento terapêutico derivado da Infant Research, na qual a interpretação e a verbalização não podem ser usadas a não ser de forma secundária. Em seguida apóia-se nas recentes constatações das neurociências que parecem integrar as duas diversas abordagens, confirmando o valor estruturante da comunicação não verbal, em particular a veiculada pelas interações, e, portanto, o valor reestruturante das intervenções terapêuticas. Este efeito agiria também para as comunicações não verbais, interacionais, na análise dos adultos; elas são o veículo da comunicação afetiva inconsciente que constitui a relação.
Ambiente compartilhado e interpretação é a contribuição de Gilbert Diatkine, psicanalista em Paris. No texto, o autor mostra que o ambiente compartilhado pelo analista e o paciente pode ser dividido em dois aspectos: por um lado, a cultura como um conjunto de representações, funcionando como um espaço transicional; por outro, a pressão social, da qual o setting deve proteger o paciente quanto o analista. No entanto, o setting analítico induz o analista a negar a realidade ocasional da pressão social. O analista tende a pensar que o trauma ocorreu antes e em algum outro lugar, não neste momento. Segundo Diatkine, se conseguirmos prestar atenção à pressão social, podemos usá-la como fazemos com outras representações sociais, como elos associativos para transformar as pulsões do paciente em representações de questões inconscientes.
Corpo, mente e simultaneidade propõe uma reflexão sobre o tema mentecorpo, recorrendo à perspectiva da simultaneidade, que permite conceber os fenômenos corpóreos e mentais (a patologia) como um único acontecimento, a cujos vestígios visíveis só em parte podemos ter acesso.
Cláudia Peregrini, Maria Grazia Bernetti, Claudio Cassardo, Rita Marino Gadeschi, Marco Ramella e Paola Vizziello, psicanalistas em Milão, desenvolvem um raciocínio acerca da importância, na teoria e na prática clínica, de se abdicar da abordagem clássica, baseada na antítese e na causalidade, para introduzir, em seu lugar, uma perspectiva complexa, baseada na noção de conjunto. Tentam, assim, ultrapassar o “monolinguismo” de algumas correntes no jargão do que consideram um “psicanalitiquês” autossuficiente, por vezes excessivamente ancorado em suas próprias teorias, para adotar, ao contrário, uma perspectiva “bilíngue” da psicanálise e das ciências biomédicas, paradoxalmente hibridadas entre si.
Silvia Elena Leguizamón, psicanalista argentina, residente em Bolonha, Itália, reflete sobre a contratransferência da ausência mútua entre paciente e analista em termos de invisibilidade. Em seu artigo A busca do “ausente” na contratransferência. A história oficial do trauma como risco, Silvia adverte para o risco de que a dor psíquica sentida pelo analista se torne intolerável, invadindo o campo e obstaculizando a função analítica, levando-o a uma construção apressada da história traumática, a uma história oficial do trauma feita de collage de representações, excesso de função interpretante com o intuito de aplacar a angústia de ambos os psiquismos. Através do caso de Clara, a autora explica o funcionamento de diversas zonas psíquicas. Na área do funcionamento operatório encontra a ausência mútua no campo analítico. No “mais além” do vazio isto permanece inatingível, ao menos teoricamente. Para defender-se da carência de psiquização ou de mentalização, de tecido psíquico, o paciente recorre a uma superadaptação à realidade. A autora busca mostrar também que, diferente das patologias do vazio, que extravasam rumo ao ato e ao soma, na desmentalização encontramos a “ausência da própria pulsão”.
Como já é tradicional em nossa Revista, encerramos este número com uma entrevista, desta vez concedida por Rosine Josef Perelberg, analista-didata da Sociedade Psicanalítica Britânica, que visitou a SPPA em 13 de agosto de 2009. Na verdade, essa edição finaliza-se com uma despedida. Esse número marca o encerramento do meu exercício como editor da Revista. Após três anos exercendo essa função, posso dizer que foi um período de muito trabalho e dedicação. Mas foi também um tempo de ampliar horizontes intelectuais, através do contato com as ideias das mais diversas correntes psicanalíticas, e pessoais, através do contato não somente com os colegas que enviaram artigos como com aqueles que avaliaram esses trabalhos. A todos eles meu agradecimento.
Levando em conta a importância da Revista para a SPPA, quero agradecer a confiança em mim depositada por Sérgio Lewkowicz, presidente no período 2008-2009, e Ingeborg Magda Bornholdt, atual presidente da SPPA, bem como às respectivas Diretorias. Os convites que ambos me fizeram para dirigir os trabalhos editoriais de nosso periódico muito me honraram.
Mas esse período foi, principalmente, um tempo de fazer algumas amizades e consolidar outras. E, por isso, quero agradecer a Tula Brum, Suzana Fortes e Rosane Poziomczyk, que me acompanharam como Editoras Associadas, e Igor Alcântara, Lúcia Thaler, Luisa Rizzo, Luiza Hoefel, Magali Fischer e Neusa Lucion, membros do Conselho Editorial. Agradeço a todos pela companhia fraterna e o trabalho dedicado. Agradeço, ainda, a Gisha Brodacz, Flávio Souza, Idete Bizzi, Patrícia Lago e Regina Sordi, que, em momentos diversos, participaram do Conselho Editorial.
Certamente, o exercício de editar uma Revista não seria possível sem a colaboração de uma secretaria. Assim, desejo expressar meu reconhecimento ao trabalho de Fabiane Martino e Rosângela Veiga que exerceram a secretaria da Revista durante algum tempo. E agradeço a Juliana Hugo, atual secretária, por seu trabalho eficiente e dedicado. Também gostaria de destacar a colaboração de Clotilde Favalli, revisora gramatical, e de Luiz Cezar de Lima, responsável pela composição de nossa publicação.
Ao me despedir, desejo à colega e próxima editora, Tula Bisol Brum, e a todos os membros do Conselho Editorial um bom e produtivo trabalho. Aos nossos leitores, agradeço pelo interesse em nossa Revista. Boa leitura a todos.
Zelig Libermann
Editor da Revista de Psicanálise da SPPA
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Atribuo os direitos autorais que pertencem a mim, sobre o presente trabalho, à SPPA, que poderá utilizá-lo e publicá-lo pelos meios que julgar apropriados, inclusive na Internet ou em qualquer outro processamento de computador.
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