Editorial
DOI:
https://doi.org/10.5281/sppa%20revista.v21i2.157Keywords:
Editorial, Psicanálise, Violência, Vulnerabilidade, Desenvolvimento psíquicoAbstract
Prezado leitor,
Bion, com precisão e clareza, descreveu a tendência natural do ser humano para funcionar emocionalmente em um nível mais primitivo, ao nos falar sobre os grupos de supostos básicos e os grupos de trabalho. Concordou com Freud que “dessa guerra nunca se dará baixa”. Nesse contexto compreendemos que a violência é inerente ao ser humano, independente do processo civilizatório que o humaniza, tornando-o vulnerável e comprometendo seu desenvolvimento psíquico. Este tema é revisitado neste número por diversos autores através de artigos e reflexões, contextualizando-o na contemporaneidade.
Schestatsky examina o ingresso do tema violência na psicanálise a partir do conceito de trauma e sua evolução. Destaca o caráter epidêmico e atual da violência contra crianças e adolescentes e a “permanência do trauma como um problema clínico e metapsicológico incontornável a ser enfrentado pela psicanálise”. Discute as vulnerabilidades decorrentes do impacto da violência crônica contra crianças e as correlaciona com a psicopatologia na vida adulta, especialmente o Transtorno de Personalidade Borderline.
Leivi propõe-se analisar a possível utilidade do conceito de vulnerabilidade
X violência na abordagem psicanalítica do sofrimento do adolescente e sua relação com aspectos centrais das sociedades contemporâneas. Já Ivanosca contribui com o trabalho premiado no Simpósio do NIA ocorrido na SPPA em maio de 2013. Relata sua vivência de inserção como psicanalista em uma equipe multidisciplinar de alto risco obstétrico. Interdialoga com áreas afins, utilizando os instrumentos psicanalíticos desenvolvidos na sua formação analítica e na observação da relação mãe/bebê (ORMB).
Anette, atual presidente da SPPA, nos brinda com A violência da identificação projetiva. Defende a ideia de que cuidadores emocionalmente comprometidos costumam usar a mente da criança para depositar angústias que não conseguem administrar. Enfatiza que o efeito nocivo da identificação projetiva desses sentimentos sobre o desenvolvimento emocional da criança torna-a vulnerável e compromete suas condições para usufruir uma vida emocional satisfatória e saudável, com probabilidade de evoluir para um quadro de personalidade borderline.
Roaldo discorre sobre a paranoia e a violência em Schreber. Recapitula
pontos essenciais da autobiografia de Schreber a partir de suas memórias e as correlaciona com obras de vários autores. Relaciona a paranoia com a origem da violência do ponto de vista da ontogênese e da filogênese. Por último examina as consequências do abuso, do trauma e suas impossibilidades de elaboração. Quanto a Salas, aborda a vulnerabilidade no/do analista. Questiona como o inconsciente não reprimido se faz presente nas intervenções do analista. Postula que, além de uma ética do desejo, seria necessária uma ética da criação de representações na análise. A seguir, com bases metapsicológicas, sugere a hipótese de que o heterogêneo, cuja reelaboração considera possível por via das identificações e desmentidas, demanda e confronta o analista com seus limites e vulnerabilidades.
Levisky, por sua vez, reflete acerca da violência na pós-modernidade e as consequentes transformações nos processos de subjetivação. Destaca a importância da reciprocidade afetiva entre sujeito-família-cultura para o desenvolvimento das atividades representacionais do psiquismo. Analisa as características simbólicas da modernidade e da pós-modernidade e as questões metapsicológicas decorrentes das mudanças impostas ao ego, superego, ideal de ego, mecanismos de defesa, estrutura narcísica e funções perceptivo-cognitivas.
Paixão, violência e desumanização é o tema desenvolvido por Ferrari. O autor discute o papel (des)estruturante da paixão na função simbolizante da pulsão como potência sublimatória na penosa busca da resolução edípica e sua importância no processo civilizatório e na humanização do sujeito. Aborda as relações entre verdade histórica e verdade e psíquica, “duas metáforas possíveis para tentar apreender a realidade”. Sugere que, na contemporaneidade, as paixões estão excessivamente deslocadas no sentido narcísico, causando complicações nas relações sujeito-objeto.
Como finalização, temos a entrevista concedida pelo psicanalista Miguel
Leivi e a psicóloga Renée Jablkowski, convidados especiais do Simpósio do NIA de 2013 na SPPA, a comissão editorial da Revista.
Desejo a todos uma boa leitura.
Tula Bisol Brum
Editora da Revista de Psicanálise da SPPA
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