Editorial
DOI:
https://doi.org/10.5281/sppa%20revista.v26i1.402Resumo
O volume com que iniciamos este ano de 2019 inaugura uma modificação no formato da Revista de Psicanálise da SPPA. Enquanto Conselho Editorial, decidimos que todos os números de nosso periódico passarão a ser temáticos. Essa mudança visa a facilitar aos leitores a pesquisa bibliográfica por assuntos, bem como a satisfazer sua preferência pela aquisição de exemplares com temáticas definidas, fato que viemos comprovando de forma expressiva ao longo dos últimos anos. Sem dúvida, interessa-nos também manter um canal aberto e profícuo para receber e publicar artigos sobre temas livres. Com esse objetivo em vista, haverá sempre espaço para trabalhos com temas variados em cada um dos três números anuais.
A relevância do tema aqui apresentado, Verdade/Mentira I, foi corroborada pela significativa submissão de artigos tanto por parte de nossos colegas da SPPA quanto por psicanalistas de outras Sociedades. Essa receptividade levou-nos à natural decisão de replicar a temática no próximo número em agosto próximo, com Verdade/Mentira II, para o qual já contamos com um número igualmente expressivo de trabalhos.
Nos primórdios da psicanálise, a finalidade da análise era fazer uma reconstrução da história dos pacientes, pois se considerava que as pessoas adoeciam de suas reminiscências, sendo necessário recordá-las e reviver as emoções correspondentes às mesmas para obter a melhora terapêutica. Acreditava-se que era desejável e possível rememorar a história tal e qual acontecera. Sabemos hoje que isso não é possível, nem mesmo necessário. As finalidades e alcances de um tratamento analítico estenderam-se. Abarcamos não apenas a transferência, mas a contratransferência, e não apenas essas, mas os fenômenos do campo analítico onde o que é fundamental não é encontrar a verdade factual, mas a verdade psíquica; vivenciar, entender e digerir os estados emocionais presentes no campo. Isso não significa dizer que não se pode trabalhar compreendendo os fatores históricos da vida do paciente e a forma como ele estruturou sua personalidade. Porém, esta não é mais a finalidade única e última da análise.
O leitor poderá verificar que os artigos elencados oferecem abordagens variadas de acordo com o enfoque e preferência dos autores. Alguns deles abordam a matéria a partir da compreensão de como os conceitos de verdade e mentira foram se modificando ao longo da história da evolução do método psicanalítico, como referido anteriormente.
Outros autores, porém, examinam a matéria partindo da tendência ao apagamento das diferenças entre os sexos e gerações e da negação dos limites, aspectos relacionados à desmentida da castração, que, com grande prevalência, observamos na clínica e na cultura nesse princípio de milênio. Outros, ainda, relacionam essa matéria com aspectos filosóficos em suas interfaces com a clínica psicanalítica. Enfim, há uma miríade de possibilidades para o estudo desse instigante tema da verdade e mentira em psicanálise na atualidade, o que nos levou à construção do presente número.
Iniciamos com um artigo clássico de Helene Deutsch, O impostor: contribuição à psicologia do Ego de um tipo de psicopata. Julgamos que valeria a pena estudar a forma como a autora compreendia um paciente que apresentava características de personalidade antissocial naqueles idos de 1955. E – com o objetivo de obtermos um contraponto contemporâneo a esse trabalho – convidamos o colega Ivan Sérgio Cunha Fetter para elaborar um comentário a respeito do mesmo, ao qual ele denominou A verdade e a mentira no “fingidor”: a propósito do artigo de Helene Deutsch.
Em sequência, Emmanuelle Chervet apresenta, em Sensação de mentira e convicção de verdade psíquica, o relato de um tratamento psicanalítico marcado pela sensação de mentira e afirma que é a ligação progressiva dos traços perceptivos em determinados enredos que permite estabelecer investimentos estáveis e percebidos como verdadeiros.
A partir de vinhetas clínicas e da compreensão de vários métodos de aferição da verdade que a psicanálise vem desenvolvendo desde Freud, Ruggero Levy, em seu artigo A verdade e a dimensão estética da psicanálise, afirma que a evolução da teoria e da técnica psicanalíticas colocaram a emoção e a noção de verdade psíquica no centro da experiência vivenciada no campo analítico. Assevera que uma experiência estética está associada à sensação dessa verdade.
O trabalho A frágil figura da verdade, de Maria Elisabeth Cimenti, destaca a ambiguidade que há no conceito de verdade e analisa a questão do que constitui a verdade em psicanálise, chegando ao exame que culmina na questão da transferência para a compreensão dessa temática.
Refletindo a respeito da forma como se dá a percepção, Viviane Sprinz Mondrzak questiona o conceito de objetividade e de acesso a verdades absolutas em Verdade/Mentira: nós e as trutas. Discute também a diferença entre mentiras constitutivas e mentiras com objetivo de manipulação do outro, bem como sobre aspectos que o tema lhe suscita em relação ao trabalho do psicanalista.
O artigo de Luis Jorge Martín Cabré, A verdade psíquica e o trabalho do analista em sessão, também demonstra preocupação por entender o lugar da verdade na clínica psicanalítica e na tarefa do analista durante a sessão. Assim como outros autores neste número, entende ser necessário falar em verdade psíquica, diferenciando-a da verdade histórica de Freud e da verdade narrativa de Spence.
Nada mais inconcebível... é o título do texto de Juarez Guedes Cruz, no qual o autor faz uma aproximação entre as reflexões de Nietzsche sobre verdades criadas na busca de certezas, e as concepções de Bion a respeito da maneira como a teoria é utilizada pelo analista para compreender o que se passa com o paciente.
Por fim, José E. Milmaniene apresenta seu trabalho Verdade/impostura/mentira. Discorre sobre as “mentiras infantis”, enquanto estratégias necessárias para o desenvolvimento da subjetivação da criança. Estuda também a mentira e suas intencionalidades e tece considerações sobre as personalidades como se e borderline, assim como afirma a potência da psicanálise enquanto busca da autêntica verdade do desejo.
Recentemente, o psicanalista David Rosenfeld remeteu-nos para publicação em português a entrevista que concedeu à Revista de la Sociedad Española de Psicoanálisis em 2018. Ficamos gratos por poder replicá-la aqui para proveito de nossos leitores.
Desejamos a todos uma ótima leitura!
Lúcia Thaler
Editora da Revista de Psicanálise da SPPA
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