Inquietante Scientia: Pensar o campo epistemológico da psicanálise

Autores

  • Filipa Falcão Rosado ISPA-IU (Instituto Superior de Psicologia - Instituto Universitário, Lisboa, Portugal)
  • Teresa Santos Neves Membro candidata da Sociedade Portuguesa de Psicanálise. Membro Associado do Centro de Investigação e Intervenção Social, Instituto Universitário de Lisboa (CIS/ISCTE-IUL).
  • Maria Emília Marques Membro candidata da Sociedade Portuguesa de Psicanálise (SPP). Professora Associada em Psicopatologia e Psicologia Clínica Instituto Superior de Psicologia Aplicada – Instituto Universitário, Lisboa, Portugal (ISPA-IU).

DOI:

https://doi.org/10.5281/sppa%20revista.v22i1.124

Palavras-chave:

psicanálise, inconsciente, epistemologia, ciência, investigação

Resumo

Assinala-se o debate que, no interior da comunidade psicanalítica internacional, opõe partidários da inscrição científica da psicanálise àqueles que liminarmente a rejeitam. Sublinha-se a emergência de uma terceira via que defende a necessidade de refletir sobre a especificidade da investigação psicanalítica. É apresentada uma reflexão epistemológica que procura clarificar a natureza da atividade científica, explorando a forma como se produz e se justifica o conhecimento designado como científico, defendendo-se que é a própria elaboração epistemológica que determina a possibilidade de constituir uma disciplina como científica. Clarifica-se o sentido da Junktim freudiana, reconhecendo-se uma base metodológica comum à cura e à investigação científica, sem que se confundam os fins e tempos específicos de cada atividade. Analisam-se os procedimentos metodológicos psicanalíticos que permitem constituir um objeto, observá-lo e produzir conhecimento sobre ele, bem como os critérios de justificação que possibilitam avaliar essa produção de saber. É esclarecida a racionalidade epistémica dos binómios associação livre/atenção flutuante, transferência/contratransferência, manifesto/latente, da multideterminação e multisignificação dos dados, do caráter aproximativo da interpretação, da revisibilidade dos modelos teóricos e dos procedimentos de supervisão e intervisão. É afirmada a cientificidade da psicanálise a partir, precisamente, da especificidade das dimensões clássicas da disciplina.

 

Abstract

Inquietante scientia: thinking the epistemological field of psychoanalysis

There is an ongoing debate within the international psychoanalytic communitythat opposes those who defend the adoption of the traditional scientific standardsin psychoanalysis to those who outright reject this approach. The emergence of athird position that supports the need to reflect on the specificity of psychoanalytic research is here emphasized. An epistemological reflection that seeks clarificationon the nature of scientific activity is presented, exploring the way the so-calledscientific knowledge is produced and justified. The idea that it is theepistemological development itself that determines the possibility of seeing adiscipline as scientific is advocated. The meaning of the Freudian Junktim isclarified, stressing a common methodological ground for the cure and scientificresearch, without confusing the specific aims and timeframes of each activity.Psychoanalytic methodological procedures – which allow the constitution of anobject, its observation and the construction of knowledge on it, as well as thejustification criteria that make possible the production of such knowledge – areanalyzed. The epistemic rationality of the following binomials are clarified: freeassociation/free floating attention, transference/countertransference, manifest/latent content; and also the overdetermination and multiple signification of data, of the approximated character of interpretation, of the revisability of theoreticalmodels, and of supervision and intervision procedures. The scientific status ofpsychoanalysis derives precisely from the specificity of the classic characteristicsof the discipline.

Keywords: psychoanalysis, unconscious, epistemology, science, research.

 

Resumen

Inquietante scientia: pensando el campo epistemológico del psicoanálisis

Se observa el debate que tiene lugar dentro de la comunidad psicoanalíticainternacional entre partidarios de la inscripción científica del psicoanálisis y losque la niegan. Se destaca la aparición de una tercera vía que apoya la necesidadde reflexionar sobre la especificidad de la investigación psicoanalítica. Se haceuna reflexión epistemológica que trata de aclarar la naturaleza de la actividadcientífica mediante el análisis de la forma cómo se produce y se justifica elconocimiento designado como científico, argumentando que es el propio desarrolloepistemológico que determina la posibilidad de crear una disciplina como ciencia.Se aclara el significado de la Junktim freudiana, reconociendo una basemetodológica común para la cura y la investigación científica, sin la confusiónentre los fines y los tiempos específicos de cada actividad. Se examinan losprocedimientos metodológicos psicoanalíticos que permiten crear un objeto, observarlo y producir conocimiento sobre ése, así como los criterios que evalúanesa producción de conocimiento. Se aclara la racionalidad epistémica de losbinomios asociación libre/atención flotante, transferencia/contratransferencia,manifiesto/latente, de la multideterminación y multisignificación de los datos, dela naturaleza aproximada de la interpretación, de la revisibilidad de los modelosteóricos y de los procedimientos de supervisión y intervisión. Se afirma lacientificidad del psicoanálisis a partir, precisamente, de la especificidad de lasdimensiones clásicas de la disciplina.

Palabras clave: psicoanálisis, inconsciente, epistemología, ciencia, investigación.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Filipa Falcão Rosado, ISPA-IU (Instituto Superior de Psicologia - Instituto Universitário, Lisboa, Portugal)

Doutoranda em Psicologia Clínica no Instituto Superior de Psicologia Aplicada – InstitutoUniversitário, Lisboa, Portugal (ISPA-IU).

Teresa Santos Neves, Membro candidata da Sociedade Portuguesa de Psicanálise. Membro Associado do Centro de Investigação e Intervenção Social, Instituto Universitário de Lisboa (CIS/ISCTE-IUL).

Membro candidata da Sociedade Portuguesa de Psicanálise. Membro Associada do Centro deInvestigação e Intervenção Social, Instituto Universitário de Lisboa (CIS/ISCTE-IUL).

Maria Emília Marques, Membro candidata da Sociedade Portuguesa de Psicanálise (SPP). Professora Associada em Psicopatologia e Psicologia Clínica Instituto Superior de Psicologia Aplicada – Instituto Universitário, Lisboa, Portugal (ISPA-IU).

Membro candidata da Sociedade Portuguesa de Psicanálise (SPP). Professora Associada emPsicopatologia e Psicologia Clínica do Instituto Superior de Psicologia Aplicada – InstitutoUniversitário, Lisboa, Portugal (ISPA-IU).

Referências

Amaral Dias, C. (2003). Modelos de interpretação em psicanálise. Coimbra: Almedina.

Anzieu, D. & Chabert, C. (2004). Les méthodes projectives. Paris: PUF.

Aristóteles. (s.d). Organon: IV Analíticos Posteriores. Lisboa: Guimarães, 2003.

Bachelard, G. (1934). La formation de l’esprit scientifique: Contribution à une psychanalyse de la connaissance objective. Paris: Vrin. Recuperado de http://classiques.uqac.ca/classiques/bachelard_gaston/formation_esprit_scientifique/formation_esprit.pdf

Bick, E. (1964). Notes on infant observation in psychoanalytic training. International Journal of Psychoanalysis, 45: 558-566.

Bion, W. R. (1962). Learning from Experience. London: Karnac Books. Recuperado de http://web.a.ebscohost.com/ehost/detail?vid=5&sid=811b866f-afc6-4967-9857-42a2ebbe03ae%40sessionmgr4005&hid=4109&bdata=Jmxhbmc9cHQtYnImc2l0ZT1laG9zdC1saXZlJnNjb3BlPXNpdGU%3d#db=pph&AN=ZBK.003.0001A

Bion, W. R. (1963). Elements of psycho-analysis. London: Karnac Books. Recuperado de http://web.a.ebscohost.com/ehost/detail?vid=4&sid=811b866f-afc6-4967-9857-42a2ebbe03ae%40sessionmgr4005&hid=4109&bdata=Jmxhbmc9cHQtYnImc2l0ZT1laG9zdC1saXZlJnNjb3BlPXNpdGU%3d#db=pph&AN=ZBK.004.0001A

Bourdeau, M. (2014). Auguste Comte. In Edward N. Zalta (Ed.), Stanford encyclopedia of philosophy. Recuperado de http://plato.stanford.edu/archives/spr2014/entries/comte/

Canestri, J. (2003). The logic of psychoanalytic research. In M. Leuzinger-Bohleber, A. Dreher & J. Canestri (Eds.), Pluralism and unity? Methods of research in psychoanalysis (pp. 137–147). London: The International Psychoanalytic Association.

Caper, R. (2009). Building out into the dark: Theory and observation in science and psychoanalysis. London and New York: Routledge.

Comte, A. (1830). Cours de philosophie positive. Paris: Rouen Frères, Libraires-Éditeurs. Recuperado a partir de http://www.gutenberg.org/files/31881/31881-h/31881-h.htm

Devereux, G. (1967). De l'angoisse à la méthode dans les sciences du comportement. Paris: Flammarion, 1980.

Dilthey, W. (1883). Selected works, Vol.1 : Introduction to the human sciences. New Jersey: Princeton University Press, 1991.

Dreher, A. (2000). Foundations for conceptual research in psychoanalysis. London: Karnac Books.

Duhem, P. (1894). Quelques réflexions au sujet de la physique expérimentale. Revue des Questions Scientifiques, 36, 179–229.

Dutra, L. H. A. (1998). Introdução à teoria da ciência. Florianópolis: Editora da UFSC.

Einstein, A. (1934). On the method of theoretical psysics. Philosophy of Science, 1 (2): 163-169. Recuperado a partir de http://www.jstor.org/stable/184387

Feyerabend, P. (1975). Against method. London: New Left Books.

Fonagy, P., Kachele, H., Krause, R., Jones, E., Perron, R., Clarkin, J. & Allison, E. (2002). An open door review of outcome studies in psychoanalysis (2 ed.). London: International Psychoanalytical Association.

Foucault, M. (1966). As palavras e as coisas: Uma arqueologia das ciências humanas. São Paulo: Martins Fontes, 1995.

Foucault, M. (1975). Vigiar e punir. Petropolis: Vozes, 1987.

Freud, S. (1913). O interesse científico da psicanálise. In Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 13, pp. 169-192). Rio de Janeiro: Imago, 1969.

Freud, S. (1916). Conferências introdutórias sobre psicanálise. Conferência I: Introdução. In Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 15, pp. 25-33). Rio de Janeiro: Imago, 1969.

Freud, S. (1923). Dois verbetes de enciclopédia: (a) psicanálise. In Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. (Vol. 18, pp. 253-270). Rio de Janeiro: Imago, 1969.

Freud, S. (1927). A análise leiga. Pós-escrito. In Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 20, pp. 241-248). Rio de Janeiro: Imago, 1969.

Green, A. (2003). The pluralism of sciences and psychoanalytic thinking. In M. Leuzinger-Bohleber, A. Dreher & J. Canestri (Eds.), Pluralism and unity? Methods of research in psychoanalysis (pp. 26–44). London: The International Psychoanalytic Association.

Herschel, J. F. (1830). A preliminary discourse on the study of natural philosophy. London: Longman. Recuperado a partir de http://catalog.hathitrust.org/Record/009719464

Hollway, W., & Jefferson, T. (2000). Doing qualitative research differently. Free association, narrative and the interview method. London: Sage.

Kant, E. (1781). Crítica da razão pura. Lisboa: Gulbenkian, 1994.

Kunh, T. S. (1962). The structure of scientific revolutions. Chicago: University of Chigago Press.

Lakatos, I. (1978). História das ciências e suas reconstruções racionais, e outros ensaios. Lisboa: Edições 70, 1998.

Latour, B. & Woolgar, S. (1979). Laboratory life. The social construction of scientific facts. Los Angeles: Sage.

Latour, B. (1999). Pandora’s hope. Essays on the reality of science studies. Cambridge: Harvard University Press.

Laudan, J. (1981). A confutation of convergent realism. Philosophy of Science, 48 (1): 19-49.

Leuzinger-Bohleber, M. & Burgin, D. (2003). Pluralism and unity in psychoanalytic research: some introductory remarks. In M. Leuzinger-Bohleber, A. Dreher & J. Canestri (Eds.), Pluralism and unity? Methods of research in psychoanalysis (pp. 45-62). London: The International Psychoanalytic Association.

Losee, J. (2001). A historical introduction to the philosophy of science (4 ed.). New York: Oxford University Press.

Marques, M. E. (2001). A psicologia clínica e o Rorschach: Modelos de observação e teorias das transformações em psicologia clínica (2a ed.). Lisboa: Climepsi.

Neves, T. S. (2008). Research in psychoanalysis: an area of controversy. Revista Portuguesa de Psicanálise. 28 (2), 33–59.

Perron, R. (2003). What are we looking for? How? In M. Leuzinger-Bohleber, A. Dreher & J. Canestri (Eds.), Pluralism and unity? Methods of research in psychoanalysis (pp. 97-108). London: The International Psychoanalytic Association.

Piaget, J. (1970). Introduction : La situation des sciences de l’homme dans le système des sciences. In R. Maheu (Ed.), Tendances principales de la recherche dans les sciences sociales et humaines. Première partie: Sciences sociales. Paris: Mouton/ Unesco.

Poincaré, H. (1902). La science et l’hypothèse. Recuperado a partir de http://www.ebooksgratuits.com/pdf/poincare_science_hypothese.pdf

Popper, K. (1972). Conhecimento objetivo: Uma abordagem evolucionária. Belo Horizonte: Editora da Universidade de São Paulo, 1975.

Quine, W. (1951). Two dogmas of empiricism. The Philosophical Review, 60, 20-43.

Ricoeur, P. (1986). La psychanalyse confrontée à l´épistemologie. Psychiatrie Française, 17, 11-23.

Sandler, J., Dreher, A. U. & Drews, S. (1991). An approach to conceptual research in psychoanalysis illustrated by a consideration of psychic trauma. International Review of Psychoanalysis, 18, 133-142.

Stengers, I. (1992). La volonté de faire science : À propos de la psychanalyse. Paris: Les Empêcheurs de penser en rond.

Stern (2000). The relevance of empirical infant research to psychoanalytic theory and practice. In J. Sandler, A. Sandler & R. Davies (Eds.), Clinical and observational psychoanalytic research: Roots of a controversy (pp. 73-90). London: Karnac Books.

Thom, R. (1980). Parábolas e catástrofes. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1985.

Wallerstein, R. (2000). Psychoanalytic research: Where do we disagree? In J. Sandler, A. Sandler & R. Davies (Eds.), Clinical and observational psychoanalytic research: Roots of a controversy (pp. 27- 31). London: Karnac Books.

Widlocher, D. (2003). Foreword. In M. Leuzinger-Bohleber, A. Dreher & J. Canestri (Eds.), Pluralism and unity? Methods of research in psychoanalysis (pp. XIX-XXIV). London: The International Psychoanalytic Association.

Winnicott, D. (1958). Da pediatria à psicanálise. Rio de Janeiro: Imago, 2000.

Publicado

20-05-2015

Como Citar

Falcão Rosado, F., Neves, T. S., & Marques, M. E. (2015). Inquietante Scientia: Pensar o campo epistemológico da psicanálise. Revista De Psicanálise Da SPPA, 22(1), 21–50. https://doi.org/10.5281/sppa revista.v22i1.124

Edição

Seção

Artigos