O negativo e o irrepresentável: avanços na metapsicologia da técnica psicanalítica

Autores

  • Ida Ioschpe Gus Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre (SPPA).

DOI:

https://doi.org/10.5281/sppa%20revista.v20i3.107

Palavras-chave:

paradigma da complexidade, negativo, processos intersubjetivos, fenômenos transformacionais, afetos irrepresentáveis, técnica analítica contemporânea

Resumo

A psicanálise contemporânea enquanto sistema aberto inscreve-se, hoje, no paradigma da complexidade (Morin, 1990), sintonizada com o pensamento multicêntrico ao não excluir o contrário, isto é, o negativo superando a lógica binária, transcendendo a fragmentação e as disjunções. A teorização sobre os processos intersubjetivos que ocorrem no espaço potencial (Winnicott, 1951) da sessão gera a noção de um aparelho psíquico ampliado, constituído pelo campo bipessoal formado por analista e paciente (Baranger & Baranger, 1961), no qual fenômenos transformacionais dos aspectos cindidos, traumáticos, do paciente, que permanecem em estado de negatividade podem emergir. O vínculo analítico contemplado pela terceira tópica (Green, 1975) exige que o fazer analítico seja revisitado, para tornar possível o aparecimento do novo capaz de dar voz ao irrepresentável através do trabalho do negativo. Configurações clínicas marcadas por afetos penosos e angústia de aniquilamento desafiam as ferramentas conceituais clássicas. A partir da década de 60, os pensadores psicanalíticos dedicam-se a trabalhar nas fronteiras que as palavras impõem ao psiquismo, elaborando a especificidade da técnica analítica contemporânea, que convoca o analista em estado de regrediência (Botella & Botella, 2003) para captar afetos inconscientes irrepresentáveis, conotando o processo analítico como criação contínua de significados.

 

The negative and the unrepresentable: advances in the metapsychology of the analytic technique

Nowadays, the contemporary psychoanalysis as an open system is inscribed on the paradigm of complexity (Morin, 1990), in tune with the multicenter thinking once it does not exclude the opposite, that is, the negative overcoming the binary logic and transcending fragmentation and disjunctions. The theorization of the intersubjective processes which occur in the potential space (Winnicott, 1951) of the session generates the notion of an enlarged psychic apparatus, composed by the bi-personal field formed by analyst and patient (Baranger & Baranger, 1962), in which the transformational phenomenon of the split and traumatic aspects of the patients, that remain in a state of negativity, can emerge. The analytical bond contemplated by the third topic (Green, 1975) requires reviewing the analytical way of doing in order to make the appearance of the new possible, which is capable of giving voice to the unrepresentable through the work of the negative. Clinical settings imprinted by painful emotions and annihilation anxiety challenge the classical conceptual tools. From the 60s, psychoanalytic thinkers dedicated their work on the borders that words impose on the psyche, elaborating the specificity of contemporary analytical technique which convokes the analyst in a state of regression (Botella & Botella, 2003) to capture unconscious and unrepresentative affections, connoting the analytic process as a continuous creation of meanings. Keywords: complexity paradigm, negative, intersubjective processes, transformational phenomena, unrepresentative affections, contemporary analytical technique.


Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Ida Ioschpe Gus, Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre (SPPA).

Psicóloga, psicanalista didata e membro efetivo da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre (SPPA).

Referências

Baranes, J. J. (1989). Desmentida, identificaciones alienantes, tiempo de la generación. In A. Missenard, J. Guillaumin, G. Rosolato, J. Kristeva, Y. Gutierrez, J.-J. Baranes, R. Moury, René Roussillon & René Kaës. Lo negativo: figuras y modalidades (pp. 103-29). Buenos Aires: Amorrortu, 1991.

Baranger, M. & Baranger, W. (1961-62). La situación analítica como campo dinámico. Revista Uruguaya de Psicoanalisis, 4 (2), 217-29.

Baudrillard, J. (1983). Simulacros e simulação. Lisboa: Antropos, 1991.

Bianchedi, E. T. (1989). Asociación libre/discociación libre: los fósiles vivientes. In _____. Bion conocido/desconocido (pp. 35-49). Buenos Aires: Lugar, 1999.

Bion, W. R. (1959). Ataques aos elos de ligação. In _____. Estudos psicanalíticos revisados (pp. 87-100). Rio de Janeiro: Imago, 1988.

_____ (1962). O aprender com a experiência. Rio de Janeiro: Imago, 1991.

_____ (1965). Transformações. Rio de Janeiro: Imago, 1983.

_____ (1967). Uma teoria sobre o processo de pensar. In _____. Estudos psicanalíticos revisados (pp. 101-109). Rio de Janeiro: Imago, 1988.

_____ (1977). Cesura. Revista Brasileira de Psicanálise, 15, 123-136, 1981.

_____ (1992). Cogitações. Rio de Janeiro: Imago, 2000.

Bleger, J. (1966). Psicanálise do enquadre psicanalítico. Revista Latinoamericana de Psicoaná-lisis, 5, 103-113, 2002.

Botella, C. & Botella, S. (1997). Más allá de la representación. Valencia: Promolibro.

_____ (2003). Figurabilidade e regrediência. Revista de Psicanálise da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre, 10 (2), 249-341.

Brusset, B. (2005). Metapsicologia do vínculo e “terceira tópica”? Relatório apresentado no 66º Congrès des Psychanlystes de Langue Française, maio de 2006, em Lisboa. Bulletin de la Société Psychalytique de Paris, n. 78, p. 19-88. [Tradução de Roberto Cunha e Luciane Falcão].

_____ (2006). Metapsicologia do vínculo e “terceira tópica”? Revista de Psicanálise da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre, 13 (2), 215-32.

Ferro, A. (1999). A psicanálise como literatura e terapia. Rio de Janeiro: Imago, 2000.

Freud, S. (1900). A interpretação dos sonhos. In _____. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 4). Rio de Janeiro: Imago, 1980.

_____ (1914). Recordar, repetir e elaborar. In _____. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 12, pp. 191-203). Rio de Janeiro: Imago, 1980.

_____ (1919). O estranho. In _____. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 17, pp. 273-318). Rio de Janeiro: Imago, 1980.

_____ (1920). Além do princípio do prazer. In _____. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 18, pp. 13-85). Rio de Janeiro: Imago, 1980.

_____ (1937). Construções em análise. In _____. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 23, pp. 289-304). Rio de Janeiro: Imago, 1980.

Green, A. (1967). El narcisismo primario: estructura o estado. In _____. Narcisismo de vida, narcisismo de muerte (pp. 78-126). Buenos Aires: Amorrortu, 1993.

_____ (1972a). Notas sobre procesos terciarios. In _____. La metapsicología revisitada (pp. 185-89). Buenos Aires: Eudeba, 1996.

_____ (1972b). La metapsicología revisitada. Buenos Aires: Eudeba, 1996

_____ (1975). O analista, a simbolização e a ausência no contexto analítico. In _____. Sobre a loucura pessoal (pp. 35-65). Rio de Janeiro: Imago, 1988.

_____ (1977a). La alucinación negativa. In _____. El trabajo de lo negativo (pp. 379-385). Buenos Aires: Amorrortu, 1995.

Green, A. (1977b). O conceito do fronteiriço. In _____. Sobre a loucura pessoal (pp. 66-89). Rio de Janeiro: Imago, 1988.

_____ (1980). A mãe morta. In _____. Sobre a loucura pessoal (pp. 148-177). Rio de Janeiro: Imago, 1988.

_____ (1983). Narcisismo de vida, narcisismo de muerte. Buenos Aires: Amorrortu, 1993.

_____ (1986). Pulsão de morte, narcisismo negativo, função desobjetalizante. In _____. A pulsão de morte (pp. 53-64). São Paulo: Escuta, 1988.

_____ (1990). Conferências brasileiras de André Green: Metapsicologia dos limites. Rio de Janeiro: Imago.

_____ (1993). Para introducir lo negativo en psicoanálisis. In _____. El trabajo de lo negativo (pp. 11-29). Buenos Aires: Amorrortu.

_____ (2000). A mente primordial e o trabalho do negativo. In The International Journal of Psycho-analysis. Livro anual de psicanálise (Tomo 14, pp.) 133-48. São Paulo: Escuta.

Hartke, R. (2005). A relação terapêutica hoje: para além da transferência, da contratransferência e das representações. Revista Brasileira de Psicoterapia, 7, 281-93.

Hobsbawn, E. (1995). A era dos extremos: o breve século XX – 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras.

Lipovetsky, G. (1983). La era del vacío: ensayos sobre el individualismo contemporâneo. Barcelona: Anagrama.

Morin, E. (1990). Introducción al pensamento complejo. Barcelona: Gedisa, 1995.

Moury, R. (1989). El apoderamiento visual o la desmentida de la pérdida. In A. Missenard, J. Guillaumin, G. Rosolato, J. Kristeva, Y. Gutierrez, J.-J. Baranes, R. Moury, René Roussillon & René Kaës. Lo negativo: figuras y modalidades (pp. 189-201). Buenos Aires: Amorrortu, 1991.

Ogden, T. H. (1995). Analisando formas de vitalidade e de mortificação da transferência-contratransferência. Revista de Psicanálise da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre, 2 (3), 465-88.

Rosolato, G. (1989). Lo negativo y su léxico. In A. Missenard, J. Guillaumin, G. Rosolato, J. Kristeva, Y. Gutierrez, J.-J. Baranes, R. Moury, René Roussillon & René Kaës. Lo negativo: figuras y modalidades (pp.23-38). Buenos Aires: Amorrortu, 1991.

Urribarri, R. (1999). La representación y lo irrepresentable: hacia una metapsicología de la clínica contemporánea. Revista de Psicoanálisis APA, n. 6, especial., 327-347.

Vattimo, G. (2002). La sociedad de la comunicación generalizada. In J. Bindè (Coord.). Claves para el siglo XXI (pp. 269-285). Barcelona: UNESCO/Crítica.

Winnicott, D. W. (1951). Objetos transicionais e fenômenos transicionais. In _____. Textos selecionados da pediatria à psicanálise (pp. 389-408). Rio de Janeiro: Francisco Alves.

_____ (1954). Aspectos clínicos e metapsicológicos da regressão dentro do setting psicanalítico. In _____. Textos selecionados da pediatria à psicanálise (pp. 459-481). Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1988.

_____ (1958). A capacidade de estar só. In _____. O ambiente e os processos de maturação: estudos sobre a teoria do desenvolvimento emocional (pp. 31-7). Porto Alegre: Artes Médicas, 1983.

_____ (1962). A integração do ego no desenvolvimento da criança. In _____. O ambiente e os processos de maturação: estudos sobre a teoria do desenvolvimento emocional (pp. 55-61). Porto Alegre: Artes Médicas, 1982.

_____ (1967). A localização da experiência cultural. In _____. O brincar e a realidade (pp. 55-61). Rio de Janeiro: Imago, 1975.

_____ (1969). O uso de um objeto e relacionamento através de identificações. In _____. O brincar e a realidade (pp.121-131). Rio de Janeiro: Imago, 1975.

_____ (1971). Objetos transicionais e fenômenos transicionais. In . O brincar e a realidade (pp. 13-44). Rio de Janeiro: Imago, 1975.

Zimerman, D. E. (2001). Vocabulário contemporâneo de psicanálise. Porto Alegre: Artmed.

Publicado

09-12-2013

Como Citar

Gus, I. I. (2013). O negativo e o irrepresentável: avanços na metapsicologia da técnica psicanalítica. Revista De Psicanálise Da SPPA, 20(3), 679. https://doi.org/10.5281/sppa revista.v20i3.107

Artigos mais lidos pelo mesmo(s) autor(es)