Editorial
DOI:
https://doi.org/10.5281/sppa%20revista.v24i2.309Resumo
Dedicamos este número à memória de Ricardo Horácio Etchegoyen, que faleceu no ano passado, entristecendo enormemente a comunidade psicanalítica da América Latina e do mundo. Nosso homenageado dispensaria apresentações, pois, além de ter sido muito reconhecido em nosso meio, foi o primeiro presidente latino-americano a ser eleito pela IPA exercendo o cargo de 1993 a 1997. Premiado inúmeras vezes, inclusive com o Sigourney award, legou-nos vasta contribuição de ordem científica, bem como cativava a todos por sua personalidade generosa, por sua ética e saber. Produziu inúmeros artigos, bem como o conhecido livro Fundamentos da técnica psicanalítica, que foi traduzido para muitos idiomas. Era amigo da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre e convidado a participar entre nós de atividades científicas por diversas ocasiões, sempre encantando a todos com sua simpatia e profundidade de conhecimentos.
Resolvemos prestar nosso tributo a este querido mestre justamente fazendo trabalhar suas ideias. Para tanto, concluímos que nada melhor do que publicarmos um artigo seu seguido pelos comentários de um de nossos colegas da SPPA que tivesse alguma ligação com ele. Decidimos que ninguém melhor do que Romualdo Romanowski para ser nosso porta-voz, pois, além de sua relevância como representante da SPPA, ele teve o privilégio de uma profícua convivência pessoal e profissional com nosso homenageado.
Compusemos então a primeira seção deste número, contendo o artigo O dilema de Salieri: contraponto entre inveja e apreço, que foi escrito em parceria de Etchegoyen e Clara Nemas e publicado no International Journal of Psychoanalysis em 2003, recebendo posteriormente versões em espanhol e português. Em continuidade, apresentamos os Comentários ao trabalho O dilema de Salieri, por Romualdo Romanowski.
Como de costume, procuramos a cada ano dedicar um de nossos números a trabalhos com temas diversos. Pensamos que assim estimulamos a escrita e o consequente desenvolvimento de nossa ciência. Temos todo o interesse em que autores das mais variadas latitudes e correntes psicanalíticas sigam submetendo seus trabalhos a nosso processo editorial. Desejamos que este número não temático seja, portanto, um convite permanente a esta participação espontânea dos colegas.
Meg Harris Williams, por exemplo, é uma autora que tem se dedicado à compreensão psicanalítica de obras literárias clássicas e contemporâneas. Tivemos a felicidade de receber por parte dela alguns desses seus textos. Tomamos a decisão de publicar cada um deles em diferentes ocasiões. Oferecemos aqui Além do complexo de Édipo: as peças tebanas de Sófocles, que aborda as implicações psicológicas da trilogia de Édipo. A tese da autora é de que o foco de Sófocles não estaria ligado primordialmente ao complexo edípico; pelo contrário, a seu ver, ele trataria este como uma questão secundária. Pensa ela que Sófocles estaria demonstrando, por meio da trilogia, como a personalidade pode superar a maldição da vingança através da busca resoluta pelo autoconhecimento.
Seguimos com A experiência de mutualidade no processo terapêutico de uma dupla mãe-bebê, cujas autoras Milena da Rosa Silva, Paula Gruman Martins e Renata Lisboa discutem o processo terapêutico de uma dupla marcada por desencontros e descompassos em sua relação e comunicação. Refletem as autoras que puderam auxiliar mãe e bebê a encontrarem sintonia e a poderem desfrutar de uma relação de trocas mútuas a partir da colocação no setting do tema da dependência, construindo assim uma experiência de mutualidade.
Um assunto que tem provocado questionamentos e tentativas de compreensão diz respeito ao trabalho psíquico que os adolescentes enfrentam na contemporaneidade para o estabelecimento de sua identidade sexual. Pela relevância e interesse deste tema, decidimos traduzir e publicar o artigo A adolescência e seus trabalhos: a homo está na moda, de Julieta Paglini e Silvia Tulián, originalmente publicado na Revista Docta, em 2009. As autoras apresentam vinhetas clínicas para pensar de que forma a definição homossexual precoce e que não tolera questionamentos por parte do adolescente estaria servindo como fuga para evitar incertezas e interrogações angustiantes. A partir dessa compreensão, formulam perguntas e hipóteses a respeito das causas e consequências desse comportamento.
O corpo petrificado: um caso de conversão histérica e mutismo seletivo é um artigo que foi apresentado no Congresso da Fepal em Cartagena em 2016. Tendo como autoras Mojgan Khademi, Foruzan Javaheri e Farah Giovannelli, relata um instigante processo terapêutico realizado no Irã, a paciente apresentando sintomas de conversão e mutismo seletivo, quadro desencadeado pela rejeição dramática sofrida por parte de um parceiro amoroso. O tratamento foi adaptado a partir da Escola Psicossomática de Paris, sendo conduzido, no Irã, por uma psicoterapeuta treinada em psicodinâmica e supervisionada, por skype nos Estados Unidos, por uma psicanalista de origem também iraniana. É curioso observar o quanto as questões culturais são determinantes na eclosão e nas manifestações da patologia, pois os conflitos e sintomas dessa paciente lembram em muito as histéricas de Freud, que eram igualmente assoberbadas por uma cultura repressora como a iraniana.
Em outro artigo, Marília Santos Krüger, colega de Porto Alegre, relata aspectos da história de vida e do percurso profissional de Marialzira Perestrello, psicanalista carioca que estudou e difundiu a história do movimento psicanalítico no Brasil, relacionando-o com o movimento modernista. Além disto, realça as contribuições que ela ensejou no campo da poesia e nas intersecções entre psicanálise e arte.
Temos também buscado prestigiar nos números não temáticos os Simpósios da Diretoria da Infância e Adolescência da SPPA. Dessa forma, oportunizamos aqui o relato de três trabalhos que fizeram parte em 2016 do XVIII Simpósio de Psicanálise da Infância e Adolescência: impasses contemporâneos na psicanálise. Os dois primeiros são relativos a atividades de responsabilidade social que vêm sendo desenvolvidas há muitos anos na SPPA. No primeiro desses, Impactos que geram impasse frente à vulnerabilidade psicossocial, Alice Lewkovicz e outras autoras utilizam o mito de Sísifo para ilustrar o trabalho que realizam em parceria com instituições de nosso município: a Secretaria Municipal de Educação e o Projeto Pescar. Além de contextualizarem estas experiências através de vinhetas, salientam o quanto os trabalhos com a comunidade, fora dos nossos consultórios, são desafiadores e despertam inquietações e sentimentos de impotência. Discutem a necessidade de dar sentido – através de narrativas – a experiências de desamparo e violência vividas pelas populações atendidas. Em continuidade, no segundo trabalho desta seção, Tania Mara Galli Fonseca discute o artigo desse grupo de colegas por meio de um comentário intitulado Sísifo em nós – considerações a respeito de parcerias da SPPA com a comunidade. Realiza uma profunda reflexão por meio de considerações advindas da área das ciências humanas e sociais em conexão com a psicanálise e com o setting grupal e social.
Já havíamos afirmado em ocasião anterior o quanto a Revista está interessada e comprometida em valorizar e divulgar os trabalhos de cunho social que vêm sendo desenvolvidos em nosso meio. Julgamos que é nossa atribuição e dever colaborar com os conhecimentos psicanalíticos para o aperfeiçoamento e melhoria das condições de vida e saúde de nossas comunidades.
O terceiro texto desta seção foi apresentado por Clara Nemas – psicanalista especialmente convidada para o simpósio. É de sua autoria o artigo Dilemas contemporâneos do analista de adolescentes. Mais uma vez neste número nos voltamos para a reflexão a respeito da adolescência na atualidade. A autora procura compreender quem e como são os adolescentes que recebemos em nossos consultórios. Indaga se deveríamos falar sobre quem eles são ou como os construímos. Estuda as vinculações entre tempo, corpo e espaço, analisando-as em conjunção com os avanços tecnológicos e a influência desses na relação dos adolescentes com a sociedade.
Finalizamos esta seção e este número com a tradicional Entrevista, que realizamos a cada vez que recebemos um convidado na SPPA. Normalmente participam de nossas entrevistas apenas os membros do Conselho Editorial. Entretanto, recebemos no ano passado o convite por parte da Diretoria da Infância e Adolescência para que a entrevista com Clara Nemas ocorresse com a participação da plateia do referido simpósio. Tivemos grande satisfação em acolher este apelo e nossa conclusão foi de que se tratou de experiência gratificante e produtiva – fato que pode ser conferido nas páginas finais de nosso periódico.
Desejamos a todos ótima leitura.
Lúcia Thaler
Editora da Revista de Psicanálise da SPPA
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