A questão da cultura nos laboratórios da etnopsiquiatria. Os laços familiares dentro do furacão da história

Autores

  • Simona Taliani Centro Frantz Fanon

Palavras-chave:

Etnopsiquiatria, Descolonização do saber, Divisão cultural, Migração, Família

Resumo

Neste artigo, Simona Taliani tenta abordar uma questão nada simples, sobretudo na Europa e principalmente na França, país em que o debate a respeito da etnopsiquiatria perdeu força a partir da publicação de 1999 de um ataque virulento feito por Didier Fassin contra Tobie Nathan. Embora existam autores que recentemente propuseram considerar as experiências terapêuticas etnopsiquiátricas sem reduzir o diálogo entre antropologia, psiquiatria e psicanálise somente àquelas críticas, uma releitura atenta das experiências é mais necessária do que nunca para pensar como este modelo pode ser retomado em países como o Brasil, local em que a questão da raça e do Outro-pária (a expressão é de Marcelo Viñar) permanece sem solução. A autora desenvolve um percurso de reflexão a partir da etnopsiquiatria italiana da forma como é realizada no Centro Frantz Fanon de Turim, através de três exemplos heterogêneos (no primeiro caso, a supervisão a uma equipe de operadores do território; em seguida, uma situação de consultoria pericial a um juiz de menores e, por fim, a relação terapêutica estabelecida com uma jovem mulher nigeriana imigrada). Nas tantas vidas atravessadas que se encontram em locais de tratamento – em que os pacientes, muitas vezes, chegam tarde ou somente depois que outras abordagens terapêuticas já teriam sido praticadas e outras interpretações da doença sugeridas –, conseguimos identificar o uso que podemos fazer da cultura como alavanca para o tratamento: somente graças a uma etnografia sem fim é possível impedir o exercício de um saber enciclopédico, mesmo que antropologicamente sensível, possibilitando o encontro com o Outro na direção de uma busca de sentido a fazer juntos.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Simona Taliani, Centro Frantz Fanon

Psicoterapeuta com formação psicanalítica no Centro Frantz Fanon. Pesquisadora, PhD em antropologia junto à Universidade de Turim (Itália). Professora titular na Universidade de Turim.

Referências

Agier, M. (2008). Gérer les indésirables: des camps de réfugiés au gouvernement humanitaire. Paris: Flammarion.

American Psychological Association (2004). Psichiatria culturale: un’introduzione. Milano: Raffaello Cortina Editore.

Augé, M. (1994). Le sens des autres. Actualité de l’anthropologie. Paris: Fayard.

Badinter, É. (1992). XY. De l’identité masculine. Paris: Odile Jacob.

Briggs, C. & Mantini-Briggs, C. (2000). “Bad mothers” and the threat to civil society: race, cultural reasoning, and the institutionalization of social inequality in a venezuelan infanticide trial. Law & Social Inquiry, 25(2): 299-354.

Corin, E. (1997). Playing with limits: Tobie Nathan’s evolving paradigm in ethnopsychiatry. Transcultural Psychiatry, 34 (3): 345-58.

Daston, L. (1995). The moral economy of science. Osiris, 10: 3-24.

Domingues, E., Honda, H. & Reis, J. G. (2019). A etnopsicanálise de Devereux no filme Jimmy P.: uma introdução à clínica transcultural. Psicologia em Estudo, 24, e38337. Recuperado de < http://www.scielo.br/pdf/pe/v24/1807-0329-pe-24-e38337.pdf >.

Fassin, D. (1999). Les politiques de l’ethnopsychiatrie. La psyché africaine, des colonies africaines aux banlieues parisiennes. L'Homme, « Revue française d’anthropologie », 153 : 231-250.

Gibson, N., & Beneduce, R. (2017). Frantz Fanon, psychiatry and politics. London: Rowman & Littlefield International.

Graeber, D. (2015). Radical alterity is just another way of saying reality. Hau, 5 (2): 1-41.

Kaplan, C. S. (2007). Love and violence/maternity and death: black feminism and the politics of reading (un)representability. Black Women, Gender, and Families, 1 (1): 94-124.

Kirmayer, J. L. (2012). Rethinking cultural competence. Transcultural Psychiatry, 49 (2): 149-164.

Latour, B. (1996). Petite réflexion sur le culte moderne des dieux faitiches. Paris: Synthélabo, Les Empêcheurs de penser en rond.

Lebigot, F., & Mongeau, A. (1982a). L’Afrique a des secrets. Questions sur la place de l’ethnographie dans la pratique psychiatrique en Afrique. Psychopathologie africaine, 18 (1): 5-29.

Lebigot, F., & Mongeau, A. (1982b). L’Afrique a des secrets II. La relation interculturelle et l’ethnographie. Psychopathologie africaine, 18 (1): 31-58.

Lock, M. (2001). The tempering of medical anthropology: troubling natural categories. Medical Anthropology Quarterly, 15 (4): 478-492.

Lock, M. (2002). Le corps objet: économie morale et techniques d’amélioration. Bulletin d’histoire politique - Corps et Politique, 10 (2): 33-46.

Mauss, M. (1950). Sociologie et anthropologie. Paris : PUF, 1968, Quatrième édition, 482 p. Collection : Bibliothèque de sociologie contemporaine.

Mbembe, A. (2014). Crítica da razão negra. Lisboa: Antigona.

Murard, N. (2008). Psychiatrie institutionnelle à Blida. Tumultes, 31 : 31-45.

Ololajulo, B. (2018). Unshared identity: posthumous paternity in a contemporary Yoruba community. Grahamstown (South Africa): African Humanities Program.

Pandolfo, S. (2008). The knot of the soul: postcolonial conundrums, madness, and the imagination. In M.-J. DelVecchio Good, S. T. Hyde, S. Pinto, B. J. Good (Eds.), Postcolonial disorders (pp. 329-358). Berkeley: University of California Press.

Sayad, A. (1999). La double absence. Des illusions de l’émigré aux souffrances de l’immigré. Paris: Éditions du Seuil.

Scholte, B. (1984). Reason and culture: the universal and the particular revisited. American Anthropologist, 86 (4): 960-965.

Segato, R. L. (2006). O Édipo brasileiro: a dupla negação de gênero e raça. Série Antropologia. Brasília: Universidad de Brasília.

Streit, U., Leblanc J., & Mekki-Barrada, A, (1998). A moroccan woman suffering from depression: migration as an attempt to escape sorcellerie. Culture, Medicine and Psychiatry, 22: 445-463.

Taliani, S. (2015). Antropologie dell’infanzia e della famiglia immigrata. In Atti del convegno. Il rovescio della migrazione. Processi di medicalizzazione, cittadinanza e legami familiari (pp. 39-40). Torino, 17-19 giugno 2015 (Aula Magna Campus Luigi Einaudi). Rivista della Società Italiana di Antropologia Medica. Recuperado de < https://www.researchgate.net/publication/318778685_Antropologie_dell'infanzia_e_della_famiglia_immigrata >.

Taliani, S. (2016). 1956 et alentours. Frantz Fanon et le corps-à-corps avec les cultures. Politique Africaine, 143: 93-111.

Viveiros de Castro, E. (2014). Who is afraid of the Ontological Wolf ? Some comments on an ongoing anthropological debate. Cusas. Annual Marilyn Strathern Lecture, 30 Mai 2014.

Winterbottom, M. (2002). In this world [Documentário]. Inglaterra, 88 min.

Downloads

Publicado

04-12-2019

Como Citar

Taliani, S. (2019). A questão da cultura nos laboratórios da etnopsiquiatria. Os laços familiares dentro do furacão da história. Revista De Psicanálise Da SPPA, 26(3), 537–566. Recuperado de https://revista.sppa.org.br/RPdaSPPA/article/view/471