@article{Brito_2017, title={Editorial}, volume={12}, url={https://revista.sppa.org.br/RPdaSPPA/article/view/306}, DOI={10.5281/sppa revista.v12i3.306}, abstractNote={É com grande satisfação que apresentamos este número temático sobre a técnica psicanalítica nos dias de hoje. Para essa edição, nosso Conselho Editorial propôs uma abordagem dos atuais rumos seguidos pela prática psicanalítica e de que modo alguns de seus autores mais proeminentes deles se ocupam. A questão suscitada parte de observações e impressões sobre uma mudança conceitual com implicações técnicas, a ocorrer tanto na literatura como nas discussões científicas psicanalíticas já há alguns anos. De modo geral essas mudanças constam no material clínico de muitos dos autores do campo psicanalítico contemporâneo e tratam, entre outros, do trabalho resultante do encontro de duas mentes (inconscientes)- em-ação expresso na teoria do campo psicanalítico e da intersubjetividade, nos aspectos técnicos do enactment, do processo sistemático de transformações como base do trabalho analítico e responsável por mudanças profundas do mundo interno, da atitude analítica centrada na capacidade negativa, sem memória e sem desejo, da construção da capacidade de figurabilidade, de mentalização, de representabilidade. Pensando nesses termos, solicitamos a renomados autores que escrevessem sobre a técnica psicanalítica na atualidade, liberando-os para abordarem o tema a sua maneira. Gostaria de enfatizar o modo positivo com que todos responderam a essa iniciativa, expondo e aprofundando aspectos centrais da questão.<p>O conjunto de textos publicados nesta revista expressa certa convergência de seus autores no entendimento de que o processo de análise estimula o desenvolvimento no mundo interno do analisando, resultante da atividade interacional consciente e inconsciente da mente do analista com a do analisando. Pelos casos clínicos expostos podemos acompanhar os processos de transformação e compreensão interna do analista (reverie) promovendo um campo apropriado para a recordação, a representabilidade e o despertar de certas funções psíquicas prejudicadas ou mesmo ainda não desenvolvidas no analisando.</p><p>Organizamos a ordem de apresentação de acordo com a seguinte estrutura: primeiro os textos sobre aspectos teóricos que embasam a atitude psicanalítica necessária à promoção do processo psicanalítico; a seguir os textos em que os aspectos técnicos (do geral para o específico) são teorizados e demonstrados através de exemplos clínicos.</p><p>Sendo assim, inicialmente Thomas Ogden, em “Do que eu não abriria mão”, reflete sobre os valores inerentes e necessários a uma boa prática psicanalítica, ou seja, cuidar de seu paciente com dignidade humana; possibilitar-lhe enfrentar a verdade de sua própria experiência emocional; responsabilizar-se no cuidado ao analisando, participar no sonhar (Bion) os sonhos “não sonhados” e “interrompidos” do paciente.</p><p>Sérgio Lewkowicz, em “Atenção flutuante focada e desfocada: algumas considerações sobre a escuta analítica”, discorre sobre o conceito de atenção flutuante e sua importância técnica como instrumento de captação de processos inconscientes primitivos do paciente. Destaca a ampliação do conceito de atenção flutuante desde Freud, passando pelos avanços de Bion e Meltzer, entre outros, com a utilização do que chama de atenção flutuante desfocada como forma de contato entre dois inconscientes para a percepção do que não é representável pela palavra dentro da sessão analítica.</p><p>James Grotstein redimensiona a noção de resistência. Revê os conceitos de resistência, reação terapêutica negativa, refúgio psíquico e equilíbrio psíquico à luz de um vértice decisivo da personalidade do analisando, elevando-os de meros mecanismos para uma organização vital subjetiva e com um propósito destinado a promover um certo equilíbrio psíquico entre as partes mais desenvolvidas e as mais atrasadas, paralisadas, ou que tenha falhado no desenvolvimento do self devido a situações de insuficiência de continente ou traumas.</p><p>Antonino Ferro, através de vinhetas clínicas, demonstra seu trabalho e desenvolvimento teórico partindo da teoria do pensamento de Bion enriquecido pelo conceito de campo dos Baranger: o campo feito de um contínuo movimento de baluartes e suas dissoluções pelo trabalho interpretativo; o campo, que passa a conter as multipersonalidades do analisando e as multipersonalidades do analista em interação e a gerar situações de um grupo a dois. Assim os acontecimentos entre analista e analisando são vistos de uma perspectiva total em que a situação analítica é resultante das interações entre analista e analisando. As transformações do campo ocorrem atravé de uma contínua operação de co-narração entre ambos que visam à alfabetização de proto-emoções e permitem seus desenvolvimentos.</p><p>A reverie do analista é fundamental nesse processo em que as narrações transformadoras ocupam um espaço essencial para o desenvolvimento da mente do analisando.</p><p>Stefano Bolognini apresenta um material clínico em que, pelo trabalho de análise, ocorre o surgimento de lembranças de uma situação traumática na vida de uma paciente. Ilustra como, a partir desse trabalho, entram novos elementos no mundo objetal interno da paciente. Esses novos elementos, que podem surgir na análise e nas relações com pessoas significativas na vida dos analisandos (destaca, neste caso particular, a figura do avô), interagem propiciando modificações de enfoque e disposição do eu central do sujeito. Destaca a importância desse aspecto sobretudo em situações traumáticas em que a experiência do self tenha sido profundamente fragmentada e interrompida e nas quais o eu desenvolve fortes estratégias defensivas contra o recordar, o pensamento e o contato com a experiência emocional.</p><p>Rossevelt Cassorla apresenta-nos seu entendimento de colocação-em-cena (enactment) como uma experiência útil e necessária no processo analítico para o entendimento de aspectos inconscientes do analisando e do analista quando passível de ser sonhado a dois (num sentido bioniano). O enactment inclui, em sua potencialidade, o caminho para compreendermos a gênese dos obstáculos à capacidade de pensar. Destaca, através de material clínico, que os enactments patológicos (o não-sonho-a-dois) que ocorrem no processo analítico não expressam apenas as falhas do analista. Na medida em que essas possam ser elaboradas pelo analista, abrem caminho para perspectivas de estados inconscientes do analisando (e, por vezes, do analista) que perturbam profundamente seu desenvolvimento. Para finalizar, Ronald Britton apresenta a clínica de uma falha na capacidade de atenção de uma analisanda que levou a um prejuízo na capacidade de elaboração e insight necessários ao bom andamento do processo psicanalítico e que resultou num impasse. O distúrbio de atenção surgiu numa etapa posterior ao processamento do conteúdo mental, quando é requerido pensar para avaliar e desenvolver pensamentos e submetê-los à prova da realidade (presentes em pacientes psicóticos ou borderlines). Desse modo o aprender pela experiência prejudicou- se e conduziu ao empobrecimento da experiência de self da pessoa. Assinala como, no processo psicanalítico, analisanda e analista encontravam-se estagnados no processo analítico pelo impedimento de desenvolverem suas capacidades de pensar, até que o analista detectou e abordou a evasão da capacidade de pensar proveniente da analisanda.</p><p>Desejamos a todos uma boa leitura e que os textos apresentados promovam nossa capacidade de pensar e aprender com a experiência, na direção de um maior conhecimento do processo analítico e da elaboração conceitual de muitos dos instrumentos presentes no encontro analista/analisando.</p><p>César Luís de Souza Brito<br /> Editor da Revista de Psicanálise da SPPA</p>}, number={3}, journal={Revista de Psicanálise da SPPA}, author={Brito, César Luís de Souza}, year={2017}, month={ago.}, pages={403–415} }